Reflexões de Neto Fortt: As ameaças tarifárias de Donald Trump estão provocando um verdadeiro "surto" na cadeia de suprimentos global.
- Neto Fortt
- 27 de dez. de 2024
- 3 min de leitura

Empresas dos Estados Unidos e da Europa estão antecipando pedidos e considerando aumentos de preços, enquanto fábricas chinesas buscam novos compradores em outras regiões. Esse cenário é uma amostra do impacto que apenas a possibilidade de novas tarifas universais pode causar no comércio global.
Na China, Sunny Hu, gerente da Hangzhou Skytech Outdoor Co. Ltd., passou dois meses apressando o envio de móveis para clientes americanos e diversificando seus mercados. Do outro lado do mundo, na Alemanha, o enólogo Matthias Arnold tenta atender a uma demanda crescente de importadores americanos antes que tarifas sobre vinhos europeus sejam restabelecidas.

Ambos os casos exemplificam como as ameaças de Trump estão moldando as estratégias comerciais globais.
Empresas ao redor do globo não esperam até a posse para se ajustar. O impacto das ameaças tarifárias já está sobrecarregando o sistema comercial com custos mais altos, estoque excessivo e gargalos logísticos. Como Robert Krieger, especialista em logística, destacou: “Estamos em um período de surto. A cadeia de suprimentos está prestes a enfrentar uma maré alta.”
Nos Estados Unidos, o CEO da JLab, Win Cramer, já deslocou parte significativa de sua cadeia de suprimentos para longe da China durante a primeira presidência de Trump. Agora, ele avalia aumentar preços de seus produtos sem fio caso novas tarifas universais sejam aplicadas. Essa estratégia preventiva é compartilhada por diversas empresas, que buscam renegociar termos ou testar novos fornecedores, embora isso traga custos adicionais e riscos elevados. No fim, quem arcará com esses custos serão os consumidores.
As preocupações sobre tarifas aparecem mais intensamente em relatórios econômicos e discussões empresariais. Dados da Bloomberg mostram um aumento significativo nas menções a tarifas em reuniões corporativas e no Livro Bege do Federal Reserve.

Economistas alertam que as tarifas não só elevarão custos, mas também agravarão a pressão inflacionária global.
Os portos chineses registraram um aumento de quase 30% na movimentação de contêineres em dezembro, e o transporte aéreo de carga subiu mais de um terço desde outubro. Nos EUA, os portos de Los Angeles e Long Beach também estão quebrando recordes, mas especialistas preveem que esse volume cairá em breve, especialmente com o fim do movimento de "front-running" — a correria para adiantar pedidos antes da imposição de tarifas.

Trump também mira os aliados. Com ameaças de tarifas de 100% sobre produtos das nações BRICS, importadores americanos estão redirecionando suas compras para o México e outras regiões. Entretanto, a transição não é simples. Como apontado por Raine Mahdi, CEO da Zipfox, atrasos podem transformar a adaptação em um processo emergencial.
O cenário também desafia pequenas e médias empresas, como a Paloma Clothing, nos EUA. Kim Osgood e Mike Roach, donos da loja, buscam adiantar pedidos para garantir estoque e mitigar riscos. Ainda assim, a incerteza é uma constante. “A única coisa que um dono de negócio abomina é a incerteza”, diz Roach.
Em Hangzhou, na China, Sunny Hu relata o impacto direto das tarifas, que já atingiram 25% de suas exportações para os EUA durante a primeira guerra comercial de Trump. A Hangzhou Skytech está tentando mitigar os riscos enviando metade da demanda prevista para 2025 antes da posse. Mas isso é apenas parte da solução. A empresa também planeja aumentar os preços em 10% a 15% para absorver custos de tarifas e frete.
A JLab, por sua vez, enfrenta desafios semelhantes. Cramer, seu CEO, explica que estocar produtos para evitar tarifas é arriscado, especialmente em um mercado tecnológico onde a obsolescência é rápida. Ele teme que a segunda rodada de tarifas de Trump exija aumento de preços, algo que não foi necessário na primeira rodada, devido às baixas margens de lucro da empresa.
Para muitos, o impacto será severo. Evelyn Suarez, advogada aduaneira, alerta que tarifas adicionais de 60% seriam proibitivas para várias indústrias. Pequenos produtores europeus, como o enólogo Matthias Arnold, estão considerando redirecionar exportações para mercados de maior margem, como a Escandinávia. Mas para aqueles fortemente dependentes dos EUA, como produtores que exportam até 40% de seu volume para o país, o futuro é incerto.
As tarifas prometem chegar rápido e durar muito mais tempo desta vez. Essa incerteza é o maior desafio, não apenas para empresas individuais, mas para todo o sistema de comércio global. As reflexões que surgem desse contexto deixam claro: o mundo dos negócios precisa estar preparado para o inesperado.
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